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EX NUNC, um romancete - 13ª Sessão

  • Foto do escritor: Algum Lucas
    Algum Lucas
  • 16 de mar. de 2020
  • 4 min de leitura

Atualizado: 21 de abr. de 2020

13ª Sessão


Boa tarde, tudo bem? Eu tô meio pra baixo essa semana. Ah, correu tudo mais ou menos, pra falar a verdade. Um segundo, posso tirar o sapato? Obrigado, tive que passar no escritório hoje cedo e preferi ir vestidinho, mas esse sapato tá comendo meu pé, tá complexa a situação aqui. Mas pronto, obrigado mesmo. Sim, sim, vamos lá. Então, é o que eu vinha dizendo: a semana foi bem mais ou menos. E digo isso porque tô até otimista, mas a coisa da escrita toda me fez pensar. Ah! Falando nisso, toma, aqui os papéis dessa e da semana passada. Esse aqui é o primeiro capítulo do romance, ia falar dele agora, por isso me lembrei. Puts, desculpa, mas posso ir ao banheiro? Hoje tô todo enrolado. Obrigado.


(Chão gelado, cruzes. Me deitar rapidinho.) Pronto, agora sim. Desculpa mesmo a agitação, hoje tava corrido. Enfim, onde eu tava? Ah, isso, a coisa toda da escrita e tal. Então, é que consegui terminar o primeiro capítulo na semana passada mesmo, acho que não muito depois de eu ter saído daqui... Ai, ai... Não sei o que tá acontecendo comigo. Agora eu dei pra voltar a contar essas mentirinhas, fingir que não sei as coisas ao certo... Terminei de escrever o capítulo no dia seguinte, e tô esses últimos seis dias sem escrever mais nada. Viu? Às vezes era isso: eu tinha vergonha de falar, vai saber.


Ah, porque reli o texto e fiquei pensando, sabe? A personagem até que ficou com bastante de mim, e justamente por isso fiquei um pouco triste. Não com o texto, em si, mas com o fato de eu ter mesmo me identificado. Porque achei o protagonista um merda e também percebi que talvez eu esteja fazendo a mesma coisa que ele, sabe? Porque essa coisa toda de escrever eu inventei muito depressa, só porque li um romance aqui e ali e tava meio pra baixo, achei que escrever seria uma boa maneira de falar dos meus sentimentos, mas cada vez mais me parece que escrever é também um mecanismo de defesa pra mim. Mais pra um engodo, na verdade. Porque eu tenho há anos esse sonho de fazer stand-up, mas aproveito toda e qualquer oportunidade que tenho pra passar algo na frente, sabe? A ideia de que fico sempre apostando no que é mais "seguro", embora escrever não me pareça a melhor maneira de fazer a vida...


Então, às vezes você fala umas coisas sobre o que eu venho falando nas últimas sessões que me passam uma impressão que (não sei...) é como se eu tivesse até aqui me esquivando das coisas. Mas eu não tenho mesmo o que falar. Por exemplo, da minha família, do Pedro e tudo o mais: nada disso interfere no meu dia-a-dia, sabe? Eu nem ao menos escrevi algo sobre isso, ou fiz piada, eu nem penso nisso. Acho que chorei pelo Pedro um punhado de vezes aí, no decorrer dos anos, mas o motivo é geralmente egoísta, tipo "por que você não ficou aqui pra ajudar a gente?" ou coisa assim.


Mas mesmo que isso que você diz (das coisas não necessariamente afetarem nosso dia-a-dia de uma maneira que a gente possa perceber) seja válido, nada muda o fato de que ele se matou, o Pai é um verme, o Juninho é um verminho e a mãe (coitada...) é uma fodida que foi criada pra isso mesmo e não trocaria a vida que tem por nada que não inclua o filho de volta. Ah, nesse quadro aí, eu não me encaixaria nem como ovelha negra, nem como verme porte médio, só acho isso mesmo: que não me encaixo. — Cruzes, é duro isso, várias vezes quando me ouço falando aqui me sinto um adolescente gigante. "Não me encaixo", não tem coisa que soe mais Nu Metal Emo sofrência anos dois mil do que isso, né? Mas, enfim, perdi completamente o foco de novo. Do que a gente tava falando?


Bom, como você disse, é isso mesmo. Mas "minha narrativa" hoje acho que se manteve, então. Ah! Me lembrei de ao menos uma coisa boa: tô sem fumar aí há um dia. Resolvi dar uma apertada no vício, e parece que funcionou. Dessa vez, não molhei os maços nem nada. Tô apostando mesmo que vou me controlar e ser capaz de dizer não, sabe? Porque se eu simplesmente bloqueio todas as maneiras que tenho de fumar, eu não tô dizendo "não", e aí o problema fica pra sempre ali, dormente. Eu tenho é que aprender a dizer não quando tô com vontade de fumar e tenho um cigarro à disposição, né? Acho que vou fracassar algumas vezes, mas vou persistir. Igual com a escrita. Não vou desistir por enquanto, afinal, eu posso ter criado um paradoxo pra mim, em que, na verdade, eu tô é usando o sonho do stand-up pra minar o sonho da escrita e vice-versa. Aí eu vou sempre começar em um e terminar no outro, sempre infeliz e nunca satisfeito com o resultado.


Também acho, vou seguir pensando nisso e tentando escrever mais. Espero que goste dos textos que trouxe hoje. Um segundo: eu te dei o cheque hoje? Nossa, ainda bem que lembrei. Quando for assim, não se sinta mal, não, pode me pedir, é um favor que você me faz, na verdade. Pronto, tá na mão. Ao menos dessa derrota a gente fugiu hoje, ponto pro time da casa! Até. Até semana que vem.




Anexo: Textos que Zé trouxe à 12ª Sessão


Romance contemporâneo


Um escritor

wannabe

um cafezinho

aqui e ali

um vazio e um bloqueio

e ennui





Queria ser poeta,

mas poeta não posso ser,

porque escrever é coisa de poeta,

e tudo o que sei é me foder.




Anexo: Textos que Zé trouxe à 13ª Sessão




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